Nunca mais te direi o que me entristece nem os motivos da minha insônia. Nunca mais ouvirás o meu chamado nem saberás do quanto andei triste, bordando as tardes com lágrimas que nem o sol conseguiu secar.
Deixei a noite atravessar os meus dias numa impertinência voraz de pássaros sonâmbulos, para que a minha boca mastigasse o teu nome. Nunca mais o pronunciei desde o tratado de paz silencioso que usamos para nos proteger da dor.
Evitamos o confronto das nossas razões, mas a memória, fustigada pela falta que fazemos um ao outro, sempre busca uma faca para cortar as flores que plantamos em nossas lembranças. Ninguém se separa de quem ama impunemente.
É preciso desconstruir as imagens, rasgar as alegrias congeladas nos ideais que insistem, reavivar as farpas, desalgemar-se das ilusões e dormir sobre as mágoas redivivas pra caminhar rumo ao esquecimento. É preciso matar e morrer pra continuar vivendo.
Aila Sampaio